sexta-feira, 17 de setembro de 2010

No ritmo do amor



Ela estava lá. Intocável, sozinha. Seus olhos vagavam o salão, observando cada casal dançar a valsa.
Seu vestido era deslumbrante, um brilho que resplandecia todos os cantos daquele local, mas não se comparava à beleza dos olhos. Pouco abertos, misteriosos, e focados em mim, como de costume.
Ela tinha a revoltante mania de tentar dizer tudo o que queria dizer através do olhar que ela tanto sabia projetar sobre mim. Embora nunca fora de falar muito, cada palavra que proferia, era de uma força letal.
Eu decidi não ficar mais olhando, talvez isso provocasse uma falsa tentativa de dissuadí-la caso ela estivesse esperando alguma aproximação da minha parte.
Meus braços se cruzaram involuntariamente, e onde estava, continuei.
Os olhos dela ardiam em mim, e mesmo que centenas de outras coisas interessantes me chamassem atenção, meus olhos ansiavam por encontrar os dela.
E encontraram. Mas desta vez, a distância estava curiosamente se estreitando entre eles.

Os passos sem rodeios, eram longos e diminuíam rápido demais o percurso até onde eu estava.
Um nervosismo desconfortável pairou, e me fez tontear. Seus olhos caminhavam melhor que as pernas, sua boca fechada esboçava um sorriso sugestivo... Ela parou a minha frente.
_ Não vai me convidar para dançar?_ Seus dentes amostra eram perfeitos, e formavam um conjunto sorriso, quase enlouquecedor de tão hipnótico. Minhas mãos geladas foram tocadas por aquelas tão calorosas mãos.
Eu não consegui me pronunciar. Mas hesitei recolhendo as mãos e baixando os olhos até o chão. Encarar aquele olhar tão profundo, sempre fora uma tarefa muito difícil pra mim, pois não tinha muita força para pensar nas palavras que deveria dizer, quando meus olhos se concentravam nos olhos dela.
_ Não sei dançar.
Uma visível expressão de desencanto ou decepção mudou sua face, fora de um sorriso a um murmúrio sem som. Mas não tive muita escolha, eu não queria perder o controle com ela, eu não poderia me deixar levar de novo.
Já me sentia confiante o bastante para me enganar achando que já havia me recuperado da paixão que sentia por ela, meses antes desse baile de formatura.
Ela olhou em volta, viu que todos ali dançavam, e junto com o faxineiro do salão, éramos os únicos que não estavam. O som dos sapatos dos rapazes fazia um coro celestial, e todas as meninas dançavam sorridentes, pude perceber a vontade que ela tinha, de fazer parte do coral da dança celeste.
_ Ora, mas todo mundo sabe dançar._ Ela me fitou, tentando fixar os olhos afundo para me pressionar a aceitar o convite.
Mas foi em vão, desviei mais uma vez, e a fiz suspirar de raiva.
_ Mas eu não sei. E não vim aqui para dançar.
As luzes perderam um pouco a força, tornando o ambiente um pouco mais romântico praqueles que ali dançavam, e um pouco mais caótico para mim e para ela.
Eu não tinha saída, mesmo podendo optar em não dançar com ela, não era do meu alcance optar por ficar longe da presença dela, afinal, ela não sairia dali enquanto a valsa não acabasse. Por orgulho, ou qualquer coisa do tipo, ela não queria parecer estar sozinha, sem companhia, então se pregou ao meu lado, indiscutivelmente.
Nossa relação nunca havia passado de conversas irônicas ou brigas, e só naqueles ríspidos minutos, já havia dito 3 ou mais frases normais. Mas isso na cabeça dela, não era nada tão relevante assim.
Sempre ficou claro pra mim, que ela não fazia parte do meu mundo, e sim dos meus sonhos, que tudo o que ela pensava sobre mim, não passava de uma psicanálise sobre a minha personalidade como mais uma pessoa existente no seu ciclo social. Ela sempre declarou pertencer à uma realidade normal, fora dos parâmetros da minha normalidade. E eu sempre fiz questão de me iludir, achando que um dia poderia conquistá-la com minhas palavras, que sempre foram usadas contra mim. E mais uma vez, elas não falharam em seu trabalho. Além de não dizer absolutamente nada significativo a ela, tudo o que disse até hoje, não provou metade do que eu seria capaz, para tê-la ao meu lado.
_ Eu ainda me assusto com a sua ignorância, sabia?_ Os calcanhares dela saracoteavam o chão para cima e para baixo numa freqüência nervosa, o que provava que alguma coisa a deixava desconfortável ao meu lado.
_ Pelo visto, só você quem mudou por aqui...
Fiz questão de deixar reticências numa frase reflexiva pra ela entender que ignorante ou não,eu ainda pensava igual e agia igual, diferentemente dela.
_ Não quis dizer que... deixa pra lá._ Ela hesitou virando o rosto novamente para a pista de dança.
_ O que quis dizer, então?
_ Não vale mais a pena falar sobre isso.
Por poucos minutos esperei uma série de insultos, mas seu tom sério me fez pular de susto, temendo o que poderia vir em seguida...
_ Sobre o que? Tem medo do passado?_ Minhas palavras eram duras demais, soavam fatais até mesmo para meus próprios ouvidos inocentes.
_ Não, acho que se esqueceu que prometeu não ter raiva de mim.
O olhar dela nunca passou tanto tempo longe de mim, nunca esteve tão desnorteado, e isso me trouxe uma clandestina sensação de arrependimento. Eu não queria falar coisas tão duras, mas a ocasião exigia o ato.
_ Você tirou todas as minhas esperanças de viver feliz, você me fez acreditar que meu lugar era ao seu lado, e eu me entreguei inteiramente a você. Eu não poderia mesmo ter raiva de alguém sem coração? O que prometi não se compara ao que você prometeu, antes de me descartar sem motivos, sem nem ao menos se importar com os meus sentimentos._
Eu não quis alterar a voz, isso provocaria uma vontade incontrolável de chorar, e ali, definitivamente não era lugar para isso.
_ Eu nunca lhe prometi nada, nunca lhe dei esperanças.
_ Nem nunca me disse que não me queria por perto.  
_ Eu não sou fria a esse ponto.
_ Nem justa também.
Um silêncio estranhamente inundou meu coração, e fez com que me calasse, junto com todas as outras mil frases que desejei jogar contra o vento.
Ela não parecia intimidada, e sua voz logo estava ecoando nos meus ouvidos mais uma vez.
_ Eu nunca quis te magoar, você sabe.
_ Nem nunca quis me fazer feliz também.
Minhas mãos estavam soando a 20 graus negativos, e meus olhos ferviam de raiva, embora não houvesse motivos para ter raiva dela, tudo isso foi causado por mim, eu quem sempre procurei fazer do sonho, realidade. E o sonho é um mundo completamente diferente da realidade... São incompatíveis.
_ Se eu disser que o que sempre quis, foi lhe fazer feliz, acreditaria?
_ Se dissesse ou se eu acreditasse?
_Eu só peço que me perdoe.
Suas palavras arrepiavam cada inalcançável lugar do meu corpo, mas nada era bom o suficiente para me convencer. Ela jamais haveria mudado.
_ Não me peça isso. Aliás, não me peça nada.
_ Só queria que me escutasse.
A música ao nosso redor, era interminável. Parecia que o tempo não passava, e cada frase dita por ela, era uma pedra que me atiravam.
_ Como quer que eu te escute? O que você quer que eu escute? Não basta todo esse tempo que me fez acreditar que sentia algo por mim?
_ Eu sentia, e ainda sinto.
Minha garganta imediatamente se estreitou, tapando cada tubo de respiração. Eu não pude sequer me mexer.
_ Ivy, não preciso disso. Estou bem como estou.
Com a ajuda divina consegui virar as costas e sair andando, aquele lugar já havia me causados coisas intensas demais por hoje.
_ Espere. Se eu disser que esse tempo serviu para eu entender que..._ Interrompi.
_ Entender o que? Que agora está sem par, e percebeu que ninguém te ama mais do que eu?
Suas mãos seguravam firme o meu braço esquerdo, incapacitando-me de continuar andando.
_ Entender que eu sempre te amei._ Ela fechou momentaneamente os olhos. E quando os abriu, pouca quantidade de água os fazia brilhar.
_ E por que você...?_ Foi a vez de ela me interromper.
_ Eu sei que errei, eu tinha medo de estar com você, tinha medo de me apaixonar, e preferi me afastar. Fui terrível ao dizer que você não significava nada pra mim, além de uma quebra de regras, de um amor proibido que me fazia achar que tinha controle do meu próprio eu, era tudo mentira, eu sempre te amei.
A valsa 
havia finalmente terminado, e todos que estavam dançando, logo assumiram seus lugares nas mesas, para esperarem os garçons com as abundantes bandejas de petiscos... Quanto a nós, sem nenhuma preocupação, continuamos a conversar.
_ Eu não esperava aquilo de você.
_ Eu larguei tudo pra ficar com você.
Durante esse meio tempo do acontecimento entre Ivy e eu, ela conhecera Tommy, o capitão do time de futebol da escola, embora o namoro dos dois não fosse tão admirável, e nenhum dos dois passasse mais que 5 minutos com o outro durante todo o dia, os dois faziam um casal relativamente perfeito. Como dizem as amigas dela: ‘um casal fofo’;
Tommy nunca pareceu se importar com Ivy, e Ivy nunca pareceu ligar para os sentimentos de Tommy, que quase não eram demonstrados a ela.
Em quase 5 meses, só consegui ter a infelicidade e o privilégio de vê-los se beijando 1 vez, entre as grades do portão de entrada da escola, quando Tommy estava do lado de fora, em horário de intervalo do treino de futebol e ela, curtia o sol do recreio com as amigas.
_ Ivy, eu...
_ Eu larguei o Tommy, passei por cima do que todos julgavam certo, eu voltei atrás pra ficar com você.
Muita gente dizia que a nossa relação era errada, e que merecíamos as fogueiras, como muitas bruxas na idade média. Mas ouvir da boca dela, que as opiniões dos outros já não importavam mais, era realmente muito significativo pra mim, pois ela sempre fora muito superficial e se baseava naquilo que todo julgavam... certo.
O olhar dela voltara com toda intensidade de antes, envolvente e provocante. Seu sorriso era espontâneo, e suas mãos tornaram a tocar as minhas.
Minhas pernas bambeavam, e meu coração acelerava a cada segundo.
_ Vamos dançar._ Ela sussurrou em meu ouvido, colocando levemente uma das mãos por trás de minhas costas, conduzindo-me até o meio da pista.
_ Não tem música._ Eu sussurrei de volta.
Ela pareceu ter ignorado minha observação de que, caso dançássemos, dançaríamos sem música, na frente de toda a escola.
A pista estava vazia, e um pânico jamais presente em mim antes, paralisou todas as partes do meu corpo, eu estava com medo. Afinal, não sabia dançar. Mas não queria fazê-la passar vergonha na frente dos amigos e professores...
_ Vem comigo, confia
em mim._ Ela me olhou fixamente.
O olhar como sempre de costume, me hipnotizou e me fez deslizar até o centro da pista de dança.
Ela me envolveu nos braços e começamos a dançar. Primeiro pra lá, e depois pra cá. Tudo vinha como um jogo de passos, só dar o primeiro passo, que o segundo pintava com facilidade.
_ Está dançando._ Ela me olhou sorrindo, orgulhosa do que conseguira.
_ Com você!
Nossos corpos estavam em uma perfeita sintonia, e todos que estavam presentes, nos observavam sorridentes, porém espantados. Estávamos dançando sem música alguma. Então, o DJ contratado pela escola, se prontificou a tocar uma música exclusivamente para nós.
_ Promete?_ Os olhos dela me comandavam.
_ O que quiser.
_ Que vai me ensinar a amar.
_ Isso todo mundo já sabe.
_ Quero aprender a
te amar._ Com a mão que batia nas minhas costas, ela afagou meu cabelo suavemente, e recostou a cabeça em meu ombro.
Seus braços nus me envolviam em um perfeito abraço._ Eu te amo._
Ela falou, quase que imperceptível ao pé do meu ouvido. Aquelas 3 palavras que sempre almejei ouvir, estavam sorrindo para mim.
Ela esqueceu a dança, ergueu a cabeça, e com um sorriso perfeitamente esculpido, aproximou sua boca da minha e tocou meus lábios vagarosamente. O beijo quente e incessante arrancou suspiros de quase todo o público que nos assistia. Os lábios mais doces que já havia beijado estavam de volta a mim, ou melhor, estavam de volta aos meus lábios, porém minha felicidade ainda não estava completa.

_ Também te amo._ eu disse.


Agora sim, acho que está completa...

2 comentários:

  1. Hm já posso morrer ?
    que perfeição. sua forma de escrever se parece com a minha, por isso achei magnífico. você me prendeu na escrita. num romantismo perfeito.

    parabéns, o texto está lindo. você está escrevendo maravilhosamente.

    beijos e saudades.

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  2. Ai que romântico, sem palavras. Adorei, dá pra continuar em uma livro :)

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